O Censo 2022 deu visibilidade ao acelerado envelhecimento da população brasileira: 46% em relação ao censo realizado em 2010. Os brasileiros com 60 anos ou mais representam 15,8% da população e o maior crescimento no comparativo entre os censos foi entre o grupo de 65 a 69 anos (63%). Além disso, nosso Índice de Envelhecimento é de 80, o que quer dizer que para cada 100 brasileiros com 0 a 14 anos de idade existem 80 com 60 anos ou mais – índice que chega a 98,0 na região sudeste.

Mas vamos imaginar que você venda brinquedos. Por que você deve olhar para o envelhecimento com cuidado?

Muito provavelmente, boa parte dos seus clientes (aqueles que pagam a conta) são avôs e avós. Exagero? Em nota técnica do IPEA, Camarano demonstra que a renda da pessoa idosa representa mais de 50% da renda de 20,6% dos domicílios brasileiros e é a única renda em 18,1% deles. Sabe a expressão “arrimo da família”? É bem isso. E tem mais: quando a renda da pessoa idosa compõe a renda do domicílio onde reside, 34,8% dessa renda é oriunda do trabalho.

Durante 16 meses, conduzi etnografia com pessoas idosas em um bairro de classe média de São Paulo. Vou listar aqui algumas situações que podem servir de aprendizado para você.

1. Quando uma pessoa idosa entrar acompanhada em sua loja, não se dirija automaticamente à pessoa mais jovem, presumindo que ela pagará a conta. Pais idosos continuam pagando a conta do jantar em família ao seguro do carro do filho, por exemplo.

2. As compras do dia a dia e o jantarzinho especial para o filho que trabalha demais e “não tem tempo pra nada” estão entre as atividades das pessoas idosas, principalmente das mães. Mas se elas não conseguem identificar os preços e se se sentem excluídas por não conseguirem usufruir um benefício restrito a quem domina seu aplicativo de descontos, elas podem procurar outro estabelecimento (e sobre embalagens, sim, pessoas idosas adorariam conseguir ler a tabela nutricional dos alimentos).

3. Quando uma pessoa idosa entrar em sua loja, não vá automaticamente empurrando ela para aquela seção de itens que você pensa que são bons para ela. Ela sabe o que é bom para ela. Isso é especialmente importante se seu negócio é moda feminina. Como notou uma das participantes:

“As vendedoras trazem umas roupas para 200 anos”.

4. Na loja ou no telemarketing, NUNCA fale gritando ou len-ta-men-te só porque seu cliente é uma pessoa idosa. Nada irritava mais os participantes da minha pesquisa. Como desabafa uma mulher:

“Eu percebo que eu fico irritadíssima com isso. Estou descobrindo isso com idade. Estou com 59 e as pessoas não levam em consideração as experiências e vivencias que as pessoas mais velhas tiveram. Estou descobrindo isso e ficando irritada. Parece que está lidando com a pessoa incapaz, mais nas atitudes de explicar coisa que já foi explicada como se o entendimento da gente fosse menor que dos jovens, vamos dizer assim”

5. Se você tem um serviço inovador, coloque um informativo de como funciona à primeira vista. Pessoas idosas evitam situações em que podem ficar vulneráveis. Como um dos participantes da minha pesquisa explicou, referindo-se à amiga que queria experimentar o Dr. Consulta, mas tinha vergonha de entrar e perguntar como funcionava:

“Por que que o jovem é mais? Porque eles dão risada se falam errado. Uma pessoa já com idade já fica com vergonha. Então não vai falar”.

6. Se seu negócio é e-commerce, invista em acessibilidade, dê feedbacks para cada ação realizada, contextualize e antecipe as dúvidas de maneira que o usuário idoso se sinta seguro. E tenha em mente que 75% das pessoas idosas que acessam a internet o fazem exclusivamente via smartphone. Ou seja, mobile-first sempre.

Outro ponto que observei é que consumidores idosos são leais.

Se têm uma boa experiência, voltam. E o principal: recomendam. E tudo que você quer é alguém apaixonado pela sua marca com dinheiro para gastar, certo?

 

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Referências:
CAMARANO, A. A. Os dependentes das rendas dos idosos e o coronavírus: órfãos ou novos pobres? Nota Técnica 81. Ipea. Julho de 2020.
Censo Demográfico 2022 : população por idade e sexo : pessoas de 60 anos ou mais de idade : resultados do universo : Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE, 2023.
DUQUE, M. Ageing with Smartphones in Urban Brazil: a work in progress. London: UCL Press, 2022.