A questão sobre a viabilidade econômica de se viver mais vem pautando o próprio modo como a velhice tem sido conceituada e representada nas últimas décadas. Já no primeiro Plano de Ação Internacional para o Envelhecimento, elaborado pelas Nações Unidas em 1982, ressalta-se o “paradoxo” implícito ao acelerado envelhecimento populacional: o desenvolvimento viabilizou o envelhecimento; o envelhecimento inviabilizará o desenvolvimento?

O paradoxo impõe a busca de um “desenvolvimento harmônico”, para o qual já são convocados diferentes atores: de governos à academia, incluindo sociedade civil e mercado. “Pessoas de todas as idades” também são chamadas para esse desafio, num esboço da abordagem atual de que a viabilidade do envelhecimento não começa na gestão da velhice em si, mas no desenho e implementação de medidas ao longo da vida que resultem numa velhice sustentável: para o indivíduo, para a família, para a sociedade, para a economia.

A última contribuição nesse sentido é do World Economic Forum’s Longevity Economy Initiative, com a publicação “Longevity Economy Principles: The Foundation for a Financially Resilient Future”. Em uma abordagem holística, são propostos 6 princípios para implementação de soluções que capacitem os indivíduos para uma longevidade resiliente e sustentável. São eles (tradução minha):

  1. Garantir resiliência financeira em eventos-chave ao longo da vida
  2. Fornecer acesso universal à educação financeira imparcial
  3. Priorizar o envelhecimento saudável como base para a economia da longevidade
  4. Redesenhar empregos e desenvolvimento de habilidades ao longo da vida para uma força de trabalho multigeracional
  5. Projetar sistemas e ambientes para conexão social e propósito
  6. Abordar desigualdades relacionadas à longevidade, incluindo gênero, raça e classe

Os fundamentos se desdobram em oportunidades de colaboração e impacto com recomendações multistakeholders, incluindo decisores em políticas públicas, mercado financeiro, empregadores e indivíduos.

Além disso, chamou minha atenção a seção “Longevity story”, presente em três dos princípios. Ainda que brevíssimas, essas narrativas têm, ao eu ver, o importante papel de ilustrar com casos reais como as mudanças sistêmicas norteadas pelos princípios ali propostos são urgentes.

 

“Nunca consegui recuperar completamente minha carreira”

 

Esse é o título da história  que ilustra o princípio 1 e que me fez lembrar de outras histórias. Durante etnografia que conduzi em São Paulo, pude observar os mesmo eventos-chave descritos nele (demissão, aposentadoria, demandas de cuidado com pais idosos), seus impactos para saúde financeira – e mental – e como eles podem desestabilizar núcleos familiares inteiros.

Em particular, lembrei da história do economista de 63 anos. A partir da experiência de idadismo que culminou no evento-chave de sua demissão, segue-se uma cascata de acontecimentos: do fim de seu casamento até a restrição de sua principal refeição diária ao programa “Bom Prato”, subsidiado pelo Governo de São Paulo. No seu caso, sua resiliência foi exercitada em outro campo, criando um outro paradoxo. Usando o único recurso abundante que tinha, seu tempo, fez voluntariado, encontrou um propósito, reconectou-se ao coletivo e pôde assim recuperar sua dignidade enquanto ainda buscava uma solução financeira para lhe viabilizar a própria velhice.

Para fazer o download do report “Longevity Economy Principles: The Foundation for a Financially Resilient Future”, acesse: https://www.weforum.org/publications/longevity-economy-principles-the-foundation-for-a-financially-resilient-future/